sexta-feira, 19 de abril de 2013

E Gene Sharp Não Falou do Occupy Wall Street - Capítulo 2 - As Ideias e Atos

Gene Sharp preside o Albert Einstein Institute, em Boston, Massachusetts, que funciona em duas salas em sua residência. Ele não conheceu o genial físico, o qual não pode ser considerado um grande pacifista, pela sua atuação nos pródromos da Guerra Atômica. Mas conta que obteve o endereço dele e escreveu-lhe sobre suas ideias, de que iria preso por isso. Einstein respondeu-lhe, que no seu lugar ele talvez fizesse o mesmo, e prometeu ler o manuscrito de Gene Sharp sobre Gandhi. Realmente o leu, e fez para ele uma introdução.

Cursando Oxford, Gene Sharp inspirou-se, e propôs uma nova análise, sobre o que sustentava o poder abusivo e o legitimava junto ao povo, e como retirar este apoio para produzir mudanças, sem violência. Sistematizou então o conhecimento aplicado em diversas ocasiões no mundo, apresentando os seus ‘198 Métodos de Ação Não Violenta’.

Como pesquisador no Centro de Relações Internacionais - Programa de Sanções Não Violentas, em Harvard, dava cursos e fazia conferências. O Departamento de Defesa dos EUA por vezes enviava oficiais escolhidos a Harvard, para um ano de estudos, e uma dessas conferências despertou o interesse do Coronel Bob Helvey, que se tornou um dos seus principais discípulos e auxiliares.

Bob Helvey foi condecorado por extremo heroísmo em ação, na guerra do Vietnã, tendo pertencido ao 5º Batalhão do 729º de Cavalaria, o famoso Regimento em que foi derrotado e morreu em combate o General Custer, em Little Big Horn, contra os índios Apaches, no século XIX.

O Coronel estava desiludido com o Vietnã, e por curiosidade, foi a uma conferência na qual esperava ver pacifistas sujos e de brincos nas orelhas. Não os encontrou, e lá se impressionou com um Professor baixinho e de voz suave, que ao se apresentar à turma dizia que estava ali para ‘debater como conquistar o poder político sem violência, e negá-lo a outros’. Ensinava que os seus métodos não violentos eram uma arma, não física, mas psicológica, social, econômica e política.

Em 1992 Bob Helvey esteve na Birmânia, ajudando a União Nacional Karen. Para lá uma ocasião levou o Professor, que entrou irregularmente no país, indo até Manerplaw, onde a frente rebelde se alocava. Pediram a Gene Sharp que escrevesse sobre o caso da Birmânia. Ele buscou um tratamento genérico, produzindo o seu mais famoso livro ‘From Dictatorship to Democracy’ (1993). Apesar das censuras políticas ao livro, ele se espalhou para a Indonésia muçulmana e posteriormente para outros países.

Em 2000, Bob Helvey esteve em Budapest, apoiado pelo Instituto Nacional Republicano dos EUA, que estava ajudando a revolta popular na Sérvia, através do movimento Otpor (Resistência). Num processo de vários anos, conseguiram a derrubada de Milosevic, desmoralizando o seu governo, com o símbolo da mão fechada e bandeiras negras, com o Panelaço, com a greve geral de 70% dos serviços elétricos, com a invasão pacífica do prédio onde o governo falsificava cédulas eleitorais marcadas com o nome de Milosevic para vencer a eleição.

Após a derrubada, o líder estudantil Srdja Popovic e outros foram estimulados a formar o grupo CANVAS, que passou a atuar em vários países. Srdja menciona o Sudão (onde copiaram o símbolo com o “sabão Girifna”), a Ucrânia em 2004, com a Revolução Laranja, outros países do sul da ex URSS, a Venezuela, Zimbábue, Iraque, Irã, Tibete, onde atuou divulgando a obra de Gene Sharp.

Houve reações de alguns governos. Em Moscou, foram misteriosamente incendiadas editoras. Na Birmânia, segundo Gene Sharp, quem possuísse os livros podia pegar sete anos de cadeia. Na Venezuela, o presidente Chávez é mostrado em vídeo criticando diretamente as ideias de Gene Sharp de “Golpe Suave” e apoiado pela CIA, e dizendo que lá não teriam vez, podendo sim deflagrar uma “explosão revolucionária popular – Jacobina”. No Irã o governo iraniano processou coletivamente como espiões grupos estudantis que liam e dispunham do manual do Professor Gene Sharp.

A televisão iraniana inclusive produziu um vídeo, figurando em desenhos animados Gene Sharp, a CIA e o governo dos EUA em reunião na Casa Branca. Gene Sharp é aí apresentado como teórico da desobediência civil, das "Revoluções Gentis" e um agente da intervenção e infiltração americana.

Ao longo do filme desfilam estas cenas, e mesmo as revoltas da China em 1989, na Praça da Paz Celestial. Gene Sharp menciona que mesmo acontecendo em 350 cidades da China, era um exemplo de falta de planejamento e objetivos predefinidos. Com as cenas discorre o filme como se fossem 6 Lições:

(1) Planeje uma Estratégia;

(2) Supere a Atomização (o isolamento que os governos estimulam no comportamento dos cidadãos e organizações populares);

(3) Coopte os Pilares de Sustentação do Poder (polícia, organizações religiosas, grupos de funcionários, exército etc.);

(4) Resista a Usar a Violência (o que é difícil no controle das multidões associadas);

(5) Pratique o Jiu Jitsu Político (aproveitar a força abusiva do adversário para derrubá-lo, transformando seus atos abusivos em indignação contra o regime, e o filme exemplifica com as tomadas e fotos impressionantes da estudante agonizante Neda, ao ser baleada pela polícia Iraniana em 2009);

(6) Não desista.

Aparecem também vistas da Tunísia e do Egito, em 2011, com declarações do líder popular Ahmed Maher, ilustrando o uso dos princípios de Gene Sharp e das novas tecnologias de comunicação alternativa das redes sociais (Facebook). Na Síria, em 2011, em processo que ainda não terminou, surge a ligação do líder popular Ausama Monajed, inclusive em visita a Gene Sharp em Boston.

Sobre os 198 Métodos, o filme destaca em quadro de fundo de cena alguns como: (17) Eleições de Brincadeira; (65) Ficar em Casa; (179) Instituições Alternativas; (18) Exibir Bandeiras e Cores Simbólicas; (27) Novas Placas e Nomes; (86) Retirar Depósitos Bancários; (35) Sátiras e Trotes Humorísticos; (133) Obedecer de modo Relutante e Lento; (87) Recusar-se a Pagar Dívidas e Juros; (23) Destruir a Própria Propriedade; (31) Incomodar Oficiais; (40) Procissões Religiosas; (19) Uso de Símbolos; (71) Boicotar o Consumo; (44) Funerais de Mentira; (51) Greves; (167) Orações; (37) Cantos (os cristãos primitivos já usavam este contra os Romanos que os achacavam).

Acusado de estar a serviço da CIA, Gene Sharp nega com dignidade, revelando ter até recebido uma oferta graciosa, mas recusou-a. Seu trabalho é livre, idealístico, realizado com o mínimo de recursos, em 2 salas em sua residência. Vitupera a incompetência do Pentágono, que em 40 anos e bilhões de dólares, pouco ou nada conseguiu, e para pesquisas na sua área ele não consegue nem 10 milhões de dólares. A Diretoria Executiva do seu Instituto é exercida por Jamila Raqib, imigrante do Afeganistão, onde sofreu como refugiada (talvez nos tempos da ocupação russa). Desde 2001 ela ligou-se a esse trabalho, com verdadeiro amor e identificação com seu mestre. É ela de uma beleza calma e simpática. Assim rebate também as acusações de apoio da CIA. O Coronel Bob Helvey é revelado pelos seus vizinhos como um defensor das armas pessoais do cidadão (permitidas pela 2ª Emenda Constitucional dos EUA), tendo 14 pistolas em casa. Também nega apoio da CIA, dizendo convincentemente a quem não acredita: “fuck yourself”. Afirma ele permanecer tranquilamente como aposentado em sua residência com seus cachorros e gatos, mas se alguém precisa, o chama, e ele pode, vai ajudá-lo. Bob Helvey fala com sinceridade ao dizer que é preciso usar uma alternativa além de matar. “Não somos bons em ocupar os países. Nem a URSS foi. Deixem os povos em paz. Devemos dar a eles do direito de mudar seus governos, se quiserem".

Gene Sharp afirma: “Não digo o que fazer, pois outro pode vir e dizer o contrário... Mas você pode aprender” (Sozinho). E: “... no mundo inteiro as pessoas estão lutando contra a tirania”. Ao final do filme ele exemplifica com a lista dos movimentos populares recentes, que ele pode ter influenciado ou não: “Venezuela, Vietnã, Zimbábue,China, Japão, Geórgia, Irã, Iraque... e deve haver outros mais"

Mas Gene Sharp não falou dos movimentos nos EUA, em Wisconsin, e do Occupy Wall Street, ponto nevrálgico de libertação não só dos EUA, como do mundo inteiro, dos grandes financistas e jogadores especulativos, do Complexo Industrial Militar, da política de livre emissão e controle da moeda mundial do FED, e dos outros Bancos Centrais das Grandes Potências sobre suas moedas, que, até ao seu final, prosseguirá sendo a única fonte possível aos governos para a fantástica alimentação financeira dos enormes dispêndios e prejuízos das guerras.

Ao concluir o filme, Gene Sharp fala do seu sonho, de ver aplicados  os métodos não violentos pelos oprimidos, e diz que aí não seria preciso mais combater terroristas, pois queles que pensassem em ser terroristas, prefeririam usar esses métodos não violentos, mais eficazes na libertação de sus povos oprimidos.

No próximo capítulo (Clique aqui para ler) você verá algumas considerações além do filme.

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